A inflação dos alimentos é pressionada pela forte seca e pelas recentes queimadas no Brasil. De acordo com analistas, os problemas podem aumentar, em um primeiro momento, os preços de mercadorias como açúcar, laranja e café, que já registraram dificuldades de produção.
A avaliação é de que as pressões tendem a ser ampliadas para outros itens da mesa do brasileiro caso a crise climática se prolongue nos próximos meses.
“É um processo que começa agora e também pode pegar determinadas culturas mais adiante, como é o caso do feijão, no final do ano”, diz o economista Fábio Romão, da consultoria LCA.
Ele espera inflação acumulada de 5,6% para os preços da alimentação no domicílio em 2024. A previsão, que já incorpora efeitos negativos do clima, estava na casa de 4,5% até o final de julho.
“A gente tem de aguardar para ver qual será o impacto [do clima] mais para frente. O viés [da projeção] é para cima”, afirma.
Os preços da alimentação no domicílio recuaram 0,52% em 2023, na primeira queda desde 2017. O segmento integra o índice oficial de inflação do país, o IPCA (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo), calculado pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística).
Conforme Romão, açúcar, laranja e café estão entre os alimentos que podem ser mais afetados neste momento pela crise ambiental.
Em parte, a projeção está associada aos estragos das queimadas em São Paulo. O estado é o principal produtor de cana-de-açúcar e laranja no país.
Na sexta (6), o preço da saca de 50 quilos de açúcar cristal branco chegou a R$ 137,06 em São Paulo, o que representa uma alta de 2,7% ante o final de agosto (R$ 133,44), de acordo com dados publicados pelo Cepea (Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada).
Antes, na terça (3), a instituição havia associado o impulso nos preços ao clima seco e às queimadas localizadas em praças paulistas.
O Cepea também identificou na sexta alta de 27,6% nas cotações da lima ácida taiti, popularmente conhecida como limão taiti, e avanço de 5,6% na laranja-pera, considerando as parciais semanais. Limitações de oferta, altas temperaturas e demanda aquecida no início deste mês estariam por trás do movimento.
“São Paulo é um grande canavial e também tem pomares para cultivo de frutas cítricas, notadamente laranja. Com os incêndios, a gente viu reflexos nas duas culturas”, diz Felippe Serigati, pesquisador da FGV Agro.
Segundo ele, a depender das condições climáticas dos próximos meses, outros alimentos também podem sofrer pressões inflacionárias. É o caso de diferentes hortaliças, que têm ciclos de produção mais rápidos.
“As ondas de calor estão acontecendo agora. O choque nem terminou para a gente tentar fazer as estimativas de impacto”, pondera o pesquisador.
No caso do café, o Cepea afirmou na quarta (4) que os incêndios em plantações da praça da Mogiana Paulista não causaram prejuízos significativos. A falta de umidade, contudo, segue como o maior problema.
“O clima adverso vem se arrastando desde os efeitos do El Niño, no segundo semestre do ano passado, afetando a produção nacional de café, que está abaixo do esperado”, disse o Cepea.
O economista André Braz, do FGV Ibre (Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas), afirma que a inflação dos alimentos consumidos no domicílio costuma acelerar após o inverno, em meio a condições mais desafiadoras de cultivo no campo.
“O ritmo de aceleração vai depender dos fenômenos climáticos”, diz.
Uma preocupação adicional é com eventuais impactos nas próximas safras de soja e milho. Os grãos são usados na produção de alimentos na indústria e também servem como insumos para a criação de animais.
Leonardo Vieceli/Folhapress